quarta-feira, agosto 07, 2002

Reproduzo aqui dois e-mails trocados com minha amiga Alice

Oi, Su. Tentei evitar escrever para você porque estou profundamente triste e, por causa da falta de tempo que disponho para expressar minhas emoções, preferia falar ao telefone rapidinho. Liguei para você por volta das três e meia da tarde e você não estava. Espero que você tenha se encontrado com alguém muito especial. Alias, aquele papo com o Fábio de validade de creminho deu asas à minha imaginação. Foi bom até brincar um pouco com os seus segredinhos para aliviar a dor da perda do meu amigo M estrinel. Depois de tantos ensaios, hoje de manhã, fui a dentista (pra variar, minha boca é o foco da sensibilidade)em hora errada. Aliás, período errado. A consulta era 15h30, e eu pensava que era as 10h30. Bem, a dentista me atendeu assim mesmo. Voltando pra casa, resolvi ir até a casa do M estrinel. Estacionei o carro a uns três quarteirões longe da casa porque estava ansiosa e também porque adoro andar por aquela rua. Existe defronte à casa dele um terreno enorme com um muro igualmente grande todo revestido de heras e alguns vasos de petúnias que o próprio Me s trinel havia plantado. Ele adorava plantas. Não havia ninguém na casa dele, mas ele continua muito presente na cor amarela da fachada da casa, no carro na garagem, e, claro, no jardim. Bem, fui a casa do vizinho, que alias parece at[e que estava me esperando. O tal vizinho estava lavando a garagem. Da[i me apresentei como amiga do M es trinel e perguntei se ele tinha notícias dele. Ele foi discreto, puxando conversa como se quisesse me preparar para a surpresa triste, que para mim não passava de uma confirma;'ao. Bem, ele se foi n'ao sei que dia nem mês. O cara só disse que o Mestrinel deve ter morrido há uns três meses. Mas que os filhos têm estado na casa. Pelas minhas contas, o Mes tri nel tinha cinco filhos - o Rafael, o Ped rinho (já moço), duas filhas que moravam com a mãe na Suíça,e a Cla ra, a caçula. Pois é, de novo deixei me consumir pelo tempo. Como é doloroso perder amigos. Já tenho tão poucos. Posso arranjar tempo para conquistar novos amigos, mas nada se compara com os velhos amigos. Minha velha amiga, se cuide,viva a vida Não vou perdoar mais ninguém que for embora para sempre. Chega de separações. Saudade dói muito.

"Todo mundo é capaz de dominar uma dor, exceto quem a sente."
William Shakespeare


Deparei esta manhã com a frase acima em um jornal do Rio. Logo, me lembrei
de você. Há muitos momentos em que não há palavras adequadas. Só o tempo, o passar
dos dias talvez amenize um pouco. Depois, a saudade continua, mas já sem
dor. Pelo menos eu tento ver as coisas desse modo. Quase todos os dias me lembro dos meus irmãos. Vez ou outra, sempre que vejo colegas, também me vem à cabeça a imagem da Ju. Ontem conversei com minha sobrinha Luciane pelo MSN. Ela me falou dos planos de ir no Dia dos Pais ao cemitério. Durante mais de 15 anos, eu também cumpri esse ritual. Já se passaram mais de 23 anos que meu pai se foi. Sempre me lembro dele com
saudade maior no Dia dos Pais. Paradoxalmente, minhas idas ao cemitério
rarearam um pouco depois da morte de meus irmãos. Ir "visitar" meu pai era
diferente. A morte dele foi relativamente natural, em decorrência de
hipertensão e derrames. Já meus irmãos... São pessoas da mesma geração, parecem parte de mim. Os amigos também... Nossa... o fato de termos perdido amigos é muito
estranho... A primeira amiga que eu perdi tinha 15 anos. Sandra Gesuatto.
Lembro-me dela até hoje. A cena do velório. Ela num caixão branco, vestida
de noiva. Morreu em um acidente quando aprendia a dirigir, com o namorado.
Depois dela, foi Sandra Tavares. Morreu de câncer antes dos 40. Deixou duas
filhas de 16 e 14 anos. Outro dia, soube que o irmão dela, Guilherme, também
morreu. Não há como deixarmos de lembrar de tantas pessoas queridas que partiram.
Quando me vejo diante dessas lembranças, gostaria muito de ter alguma
crença. Mas não tenho mesmo. Tento entender a eternidade como algo que resta
na memória das pessoas. Vejo, simbolicamente, o paraíso como doces
lembranças que podemos deixar no coração das pessoas que conviveram
conosco... Então, minha querida amiga... O que posso lhe dizer para amenizar sua dor?
Que deixe as lágrimas correrem, lavarem tua alma... Faça sua homenagem
resgatando as melhores lembranças que tiver de Mestrinel. Não lamente por
não ter dado tempo de vê-lo mais uma vez. Importa que quando ele queria,
podia, vocês estiveram juntos o tempo suficiente para se curtirem, para
tanto aprenderem um com o outro.

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