domingo, setembro 04, 2005

A dona da história

Depois de muito tempo, voltei a ver filmes brasileiros. Ontem assisti "A dona da história". Gostei. Minha filha até falou que eu pareço com a protagonista. Admito que tenho muito a ver, sim! Não são poucas vezes que me vejo conversando com outras "eus" que ficaram ao longo dos últimos trinta anos.
Gosto de rever cenas daquele tempo, embora eu seja de alguns anos depois. A personagem vivida por Maireta já estava no "segundo normal" em 68. Eu ainda terminava o grupo escolar.Foi naquele ano que tomei gosto pela literatura.Para enfrentar o exame de admissão, havia me matriculado num cursinho dado pela minha própria professora, a dona Maria Joana. Frequentei apenas um mês. A própria professora me dizia que não havia necessidade. Afinal, eu era a melhor aluna da classe. Mas, por precaução, meu pai e irmãos acharam melhor eu me preparar mais.Não pensei duas vezes. No mês seguinte resolvi dar destino mais interessante aos dez mil cruzeiros (a nota de Santos Dumont) que me davam pra pagar o curso. Com aquele dinheiro, poderia comer um belo sanduíche e tomar guaraná todos os dias! Um palmo de pão bengala com muita mortadela era o que comprava numa vendinha da periferia. Vez ou outra invdestia num doce "de geladeira" na Panificadora Copacabana, a mais chique de minha cidade.Outra coisa deliciosa era o danone de frutas. O de pêssego tinha um aroma inesquecível.Como dizia, tomei gosto pela literatura durante minhas fugas vespertinas. Passava pela biblioteca, pegava um livro e ficava embaixo do pontilhão, na passagem da ferrovia, acho que desativada naquele ano. A cada dois ou três dias, conseguia devorar um livro inteirinho. Meus preferidos eram de José Mauro de Vasconcelos. Já me considerava "muito grande" para Monteiro Lobato. Li também a série "Pollyana", "Diário de Anne Frank" e o fortíssimo "Diário de Ana Maria".

Passei no exame com nota que me permitiu ficar na rabeira da primeira turma: 8.8. Aos 11 anos, passei o ano todo de 69 na casa de minha irmã, que tinha dois filhos, de 9 e 6 anos. Nada vi dos movimentos estudantis de que tanto falam. Mas ao retornar a minha cidade, em 70, soube de "desaparecidos", "subversivos" e "comunistas". Subversivos eram os vilões, mais ou menos a imagem que fazem de traficantes às crianças de hoje.
No Carnaval de 71, ao som de "Eu te amo meu Brasil", conheci o salão de baile. Justamente um "subversivo" me arrastou para a folia. Ambos de calça jeans americana desbotada, de falsa boca-de-sino. Tenho a imagem fotográfica da camiseta regata marinho que eu usava e da camisa dele...
Tal qual no filme, me vejo muitas vezes conversando com aquela garota.

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